Se procurarmos no dicionário a definição de talento, vamos encontrar entre outras, o seguinte: “Aptidão natural ou adquirida. Engenho, disposição, habilidade.”
Por curiosidade, no mesmo dicionário, e para a palavra trabalho, podemos encontrar estas definições: “cuidado que se emprega na feitura de uma obra. = ESMERO. Obra feita ou que se faz ou está para se fazer. Labutação, lida.”
Ao nível do Desenvolvimento Pessoal e do Coaching, gosto de olhar para esta matéria através destas duas fórmulas:
1. Potencial – ruído = Performance (Desempenho)
2. Evento + Atitude = Resultado
E passo a explicar mais em detalhe:
Na primeira fórmula, podemos olhar para o potencial como o nosso talento para fazer algo. No meu trabalho com Atletas e Líderes, este é um dos temas que abordamos para desenvolvimento ao nível de Coaching. Qualquer CEO ou Diretor Geral, é um Atleta de Alta Performance no desempenho das suas funções. Se bem que o talento (potencial) é fundamental, é o ruído interno que o pode limitar.
No seu livro “The Inner Game of Tennis”, Timothy Gallwey diz o seguinte:
“Em todo o empreendimento humano existem duas arenas de jogo: a exterior e a interior. O jogo exterior é jogado numa arena exterior para superar obstáculos exteriores para alcançar um objectivo exterior. O jogo interior tem lugar dentro da mente do jogador e é jogado contra obstáculos como o medo, insegurança, falta de foco e conceitos de limitação ou suposições. O jogo interno é jogado para superar obstáculos auto-impostos que impedem o indivíduo ou a equipa de aceder a todo o seu potencial.”
Talento ou potencial, é algo inato. Podemos dizer que é algo que nasce connosco, ou se tem ou não se tem. No entanto, se olharmos ao nosso redor, vamos sempre encontrar dois cenários; um onde temos pessoas com elevado talento e com resultados reduzidos, e outro onde pessoas com um potencial ou talento, dito normal ou de acordo com a média, onde os seus resultados superam em larga escala o de outros. Porquê?
Porque talento “per si” não basta! É preciso ação, é preciso concretizar esse talento, essa aptidão inata, em resultados! Olhando de novo para a 1.ª fórmula, é o resultado da diferença entre o nosso potencial, talento e ruído, que vai ditar a nossa performance, desempenho/ação.
Mas o que é então o ruído!? Como Timothy Gallwey tão bem menciona no excerto do livro partilhado em cima, o ruído é o nosso Jogo Interno. É a forma como qualquer um de nós processa internamente informação resultante de eventos externos.
Um dos exemplos que costumo utilizar em contexto de formação ou palestras, e que traduz a segunda fórmula (Evento + Atitude = Resultado), é uma história que escutei em tempos sobre aquele que foi, e é considerado o melhor piloto de F1 de todos os tempos: Ayrton Senna da Silva.
Conta-se que com 9 anos, o Beco, alcunha pela qual era Senna era conhecido em criança, corria uma prova de Karts no escalão acima dele; todos os outros concorrentes eram mais velhos que ele, tinham 12 anos e mais experiência. Ainda assim, o pequeno Beco, fazia o que já na altura era normal para si: liderava a prova com uma larga vantagem, muito culpa e fruto do seu potencial, do seu talento inato.
A meio da prova, aconteceu o inesperado, um “dilúvio”! Começou a chover torrencialmente! O Beco, não habituado ainda a essas condições adversas, volta após volta, começou a ver a sua distância a reduzir face aos demais pilotos em prova. Não sendo isso por si só suficiente, um erro de condução atira-o para fora de pista! Num instante, passa de Líder da prova, para a cauda da prova, para o último lugar! Nesse mesmo dia e ao chegar a casa, partilha com a Dona Neide e o Sr. Milton, seus Pais, que “de hoje em diante e sempre que chover eu quero estar na pista a treinar!”
Foi essa decisão que tomou, com apenas 9 anos, que mais tarde o tornou conhecido como o mago à chuva e lhe deu a primeira vitória na Fórmula 1 ao volante de um Lotus preto com o n.º 12. Nesse domingo, 21 de Abril de 1985, um jovem piloto em ascensão bateu nomes como Lauda, Prost, Mansell, Patrese e Piquet e arrebatou a primeira de muitas vitórias na sua carreira.
O Senna tinha talento? Tinha potencial? Tinha, sem qualquer sombra de dúvida!
Quem se lembra, e teve o privilégio de o ver correr, é inequívoco em o afirmar. Por isso e olhando de novo para a primeira fórmula, o Potencial estava lá. O seu desempenho que gerou três títulos mundiais e inúmeros recordes que só foram batidos muitos anos após a sua morte, também. Ainda assim, e se fizermos a “conta”, o desempenho está dependente do ruído interno.
É todo um conjunto de factores como o medo, insegurança, falta de foco ou foco disperso, e conceitos de limitação ou suposições, grande parte deles auto-criados e auto-impostos, que sustentados e apoiados nas nossas crenças e valores, vão ditar a maximização ou limitação do nosso desempenho.
Acredito que não podemos dissociar talento e performance (desempenho, atitude, trabalho).
Ambos os conceitos estão interligados. Acredito também que talento só pode gerar resultados se existir ação, ação massiva desse talento. Apenas assim podemos maximizar resultados. De nada nos serve ter algo que é inato, se não o aplicarmos.
A atitude, porém, é aquilo que vai materializar esse talento. É a repetição da execução, é o treino, é a predisposição para dar o “extra mile”, para fazer o que os outros não fazem, que gera resultados.
Em contexto empresarial, aquilo que observo nos meus clientes, é que é o aperfeiçoamento de estratégias e rituais que os levam a assumir mais e melhor riscos, a tomar decisões de uma forma mais assertiva, mais rápida e “certa”, é a dedicação, o foco, o compromisso, a disciplina, a consistência e a determinação que geram resultados de excelência.
Podemos olhar para este binómio do Talento vs. Trabalho como o do Líder; nasce-se Líder ou torna-se líder?
Sem dúvida que temos inúmeros casos, que em tenra idade observamos já traços de liderança. Dentro desses casos, quantos se materializam em Líderes mais tarde? O mesmo acontece com o inverso, alguém que nos acompanhou na nossa infância e em quem nunca observámos traços, características de Liderança, e que mais tarde nos surpreende com uma brilhante carreira no desporto ou nos negócios, fruto acima de tudo da sua performance, do seu desempenho, do seu Trabalho.
Talento sem trabalho não gera resultados. Trabalho sem talento gera resultados. Os mesmos resultados? Muito provavelmente não, mas com repetição, resiliência e persistência, até talvez esses mesmos resultados podem ser idênticos ou superiores.
Acredito que é acima de tudo o nosso Jogo Interno, aquilo que decidimos acreditar e valorizar, que vai ditar a materialização do talento em resultado e também o nível de trabalho, aplicado ao talento, ou à falta dele. Como em tudo na vida, é uma questão de equilíbrio e objetivos.
Como Coach, baseio grande parte do meu trabalho em perguntas, pelo que gostaria de fechar este artigo com uma questão: qual o nível de trabalho que deves e estás disposto a aplicar, para maximizar o teu talento e atingir o resultado que desejas?