Render-me às evidências
O cérebro humano funciona como uma máquina de previsão. Está permanentemente a avaliar o espaço à sua volta e a analisar a informação que consegue encontrar.
Dentro dele existe como que um “gigante processador” que está a recolher e a analisar todos os dados a que consegue ter acesso.
O nosso cérebro codifica automaticamente as lições que aprendeu com a experiência. Nem sempre somos capazes de explicar o que estamos a aprender, mas essa aprendizagem está sempre a acontecer, e a nossa capacidade para identificar os estímulos relevantes a uma determinada situação, é o alicerce de todos os hábitos que temos.
Uma das revelações mais surpreendentes acerca dos nossos hábitos é que para um hábito começar, não precisamos de ter consciência do estímulo que o iniciou. Temos de nos render às evidências, ou seja, podemos reparar numa oportunidade e fazer algo sem lhe dedicar atenção consciente.
Esta é uma das características que tornam os hábitos essenciais à nossa vida, executar determinadas tarefas sem termos de estar constantemente a refletir sobre elas. Quase como se o nosso corpo continuasse a movimentar-se sem que o nosso cérebro tenha de estar “ligado”. Na realidade ele continua ativo, simplesmente não precisa de trabalhar em todos os processos racionais para que determinado hábito aconteça.
Por outro lado, também temos o revés deste funcionamento, da mesma forma que os hábitos são tão úteis e poderosos, também podem ser prejudiciais e perigosos. À medida que se formam, os nossos atos passam a ser determinados pela nossa mente automática e não consciente.
Executamos muitas rotinas sem percebermos de facto o que está a acontecer. E quanto mais repetimos estes padrões, menor é a probabilidade de nos interrogarmos acerca daquilo que estamos a fazer e o porquê de o estarmos a fazer.
Só conseguimos mudar algo, quando temos a consciência de que isso precisa de ser mudado. Pelo que, antes de conseguirmos realmente criar novos hábitos, precisamos de avaliar aqueles que já temos.
Como um dia afirmou o psicólogo Carl Jung: “Até tornarmos consciente o não consciente, ele vai comandar a nossa vida – e chamaremos a isso destino.”
Pelo que, o primeiro passo para mudar os nossos hábitos, é fazer uma listagem e classificação dos nossos hábitos.
Listagem e classificação de hábitos
Quanto mais automático um comportamento se torna, menos provável é lembrarmo-nos conscientemente dele. Como partilhei anteriormente já aqui no blog, isto corresponde ao patamar do inconsciente competente, ou seja, Eu Não Sei que Sei. E quando já fizemos a mesma coisa mil vezes, começamos a descurar pormenores. Partimos do pressuposto que a próxima vez deve ser igual à última.
Estamos tão acostumados a fazer o que sempre fizemos, que nem paramos para perguntar se é mesmo a coisa certa.
Muitas das nossas falhas estão relacionadas com a falta de autoconsciência, e é exatamente por isso que a primeira coisa que devemos fazer para mudar os nossos hábitos é elevar a nossa consciência. Sair do inconsciente incompetente para o consciente incompetente, passar de “Não sei que não sei” para “Sei que Não sei”.
Para mudarmos de hábitos, um dos nossos maiores desafios é manter a consciência daquilo que realmente estamos a fazer. Isto ajuda a explicar porque é que as consequências dos “maus hábitos” podem surpreender-nos. Porque muitas vezes estamos a fazer algo sem ter noção do porquê de ainda o estarmos a fazer.
Quando estamos a classificar os nossos hábitos, eles em si não são bons, nem maus. Até porque a intenção por detrás de um determinado comportamento que ditou um hábito é, por norma, sempre “positiva”. O que podemos perceber é se determinado hábito é eficaz e adequado para a nossa identidade.
Hábitos adequados e eficazes significam duas coisas: primeiro que se revelam coerentes com a nossa identidade, e segundo, que são capazes de resolver os nossos problemas persistentes do dia a dia.
Se um hábito não é adequado, então quer dizer que não está de acordo com a minha identidade. Como por exemplo, eu considerar-me ou ser alguém saudável e ter o hábito de comer frequentemente fast food. Um hábito não é eficaz quando não está a ser capaz de resolver determinado problema. Imaginando que eu quero ser um corredor de maratonas, mas apenas corro uma vez por semana.
É por isso que é importante, depois de listar os nossos hábitos, classificar cada um deles. Sabemos que quando dizemos que um hábito é “bom” significa apenas que ele é adequado e eficaz.
Então a estratégia, consiste em 2 passos:
- Listar todos os nossos hábitos – para que isso crie a consciência acerca dos nossos comportamentos e torne claro o que neste momento estamos a fazer.
- Classificar os nossos hábitos – perceber se cada hábito da nossa lista está a ser eficaz e adequado. E se não, identificar o porquê de isso não estar a acontecer. Aquele hábito é incoerente com a minha identidade, ou não está a ser suficientemente eficaz para resolver os meus problemas.
Em suma, o processo de mudança de comportamento começa sempre com a tomada de consciência. E a estratégia de listar e classificar os nossos hábitos, é uma excelente forma de identificar os nossos hábitos e reconhecer quais os estímulos que desencadeiam os hábitos, de forma a reconhecer quais deles nos beneficiam e que estão coerentes com a nossa identidade.